Livro: NORA WEBSTER

Comentário de Murilo Veras

NORA WEBSTER – UMA VIÚVA - 13.11.15

Tenho já algumas ideias a respeito do livro do premiado autor irlandês Colm Tóibín. Já discutimos no Clube do Livro este autor, indicação de nosso valoroso leitor Veloso.
As primeiras linhas do romance não me encantaram, por achá-lo meio ensosso, do ponto de vista do enredo, arrastado e cheio de mexericos de personagens. Mas, aos poucos, vou ficando mais atento ao correr da história. É uma narrativa sobre uma viúva – NORA WEBSTER – que, depois de vinte e cinco de casada com o professor Maurice, enviúva, o marido tendo falecido, ao que parece de ataque cardíaco ( ou tuberculoso?). E fica a dúvida de como um professor irlandês, vem a morrer tuberculoso, no chamado primeiro mundo. O sistema de saúde irlandês é igual ao do Brasil, precário? Ou nosso mestre ganhava mal, pois os bens que deixou à viúva foram precários: uma casa. E a viúva ter de sustentar quatro filhos (Donal e Conor, menores) e mais duas filhas na Faculdade (Fiona e Aine).
Aos poucos, fui me interessado pelo romance da viúva. Ela sofre de depressão pela perda violenta do marido, está em dificuldade financeira, não pode pagar os colégios das filhas, tem de morar com uma irmã, Catherine, com quem, por sinal, não se dá muito bem. Indícios de problemas até mesmo de questão religiosa. Aliás esse assunto parece que vai ser explorado mais tarde, pois estou na página 130, cinco capítulos apenas.
Catherine sugere que, depois do enterro do marido, Nora leia dois livros: Thomas Merton, monge católico e Theillard de Chardin, padre jeusuíta, muito badalado pelos anos 1950 – este autor do “O Fenômeno Humano”, livro muito interessante sobre antropologia, mas que foi indiciado pela Igreja como obra inadequada, aliás toda a vasta obra do autor.
Então vê-se, em linhas gerais, que o autor vai explorar esses assuntos ao longo de seu romance. Nora vai começar a trabalhar, numa empresa onde já trabalhara, quando solteira, para sustentar a família. Vão certamente surgir problemas, dificuldades, creio que, também, sobre o conflito católicos versus protestantes, aliás corriqueiro na Irlanda dividida.
Vamos esperar o que acontece até o final do livro.
16.11.15

Terminamos a leitura do livro de Toíbin. De certo modo, o enredo atende às nossas expectativas, ou seja, aquilo que havíamos esperado se concretiza. Nossa personagem – NORA WEBSTER – vai agir conforme linha estabelecida pelo autor. Depois dos primeiros capítulos, não nos deparamos com nenhum fato ou ato extraordinário. O autor continua a fotografar a vida de Nora, até em minudências, muitas até indiscretas, como a escolha de vestidos que faz em loja de departamento da cidade, os momentos em que ela vai ao banheiro, sem falar nos inúmeros blá-blá-blás, na troca de ideias, conversas fiadas, futricas familiares, bate-bocas, exposição de egos feridos e por ai vai num verdadeiro dedilhar de acontecimentos em que acaba se consumindo o enredo do livro.
É certo que Toíbin não construiu um “best-seller”, mesmo que a crítica oficial ou os jornalistas de plantão, marqueteiros midiáticos, queiram fazê-lo como tal, baseados na vendagem, nos prêmios recebidos pelo autor, sua estilística atraindo muitos leitores, essa política de que sempre se valem os editores, para arrecadarem mais lucros.
Prefiro dizer que o livro é um relato intimista, espécie de biografia autorizada. Não tem absolutamente os elementos-chaves do estilo “best-seller”, que caracterizaria o recheio específico deste tipo de livro: crime, suspense, mulheres sensuais e fatais, cenas de sexo explícito ou inexplícito, roubos fantásticos, famílias corruptas, atos de vingança, violência – e uma sequência de atos e fatos tais que aterrorizem ou prendam a atenção do leitor nessa ou naquela situação.
Ao contrário de tudo isso, Nora não é um personagem extraordinário, o autor a coloca como uma pessoa comum, com todos os seus grandes ou pequenos defeitos, mas todos humanos. É uma viúva, católica assim como toda a família, dela e do marido Maurice, que perde o marido faz pouco tempo. Ela luta por prosseguir com sua vida, na medida do possível longe dos holofotes das fofocas, preocupando-se demais com os filhos – como sabemos quatro, Donal, Conor, rapazinhos e Fiona e Aine, mais velhas. Donal que ao final da história já tem quinze anos, é gago, certamente devido a morte do pai, que gosta de fotografias, mas tem problemas em se adaptar com os colegas na escola. Nora vai ter de lidar com precaução para que ele não piore e que não seja, por isso, discriminado, inclusive entre o irmão e as duas irmãs. Fiona, por exemplo vive espinafrando com ele, embora tenha coração mole – acaba de ser formar como professora. Aine, a irmã mais nova, tem caráter mais forte, acaba se metendo com política, chegando a participar de comícios de rua quando dos conflitos entre protestantes e católicos, ocorridos na Irlanda em 1972.
A vida de Nora vai transcorrer nesse diapasão, ela sempre procurando se proteger, proteger sua privacidade, tendo que se impor, pois todo mundo na cidade parece dedicar-lhe pena. Prefere não receber ajuda nem comiseração de ninguém. Ela quer vencer por si próprio, dai ter procurado emprego e assim torna-se funcionária de antiga empresa, onde já havia trabalhado como solteira.
Mas ela tem problemas financeiros, tem de vender sua casa em Cush, vai viver com os filhos algum tempo com a Catherine, as duas não se bicam. E fica-se sabendo que Nora é na família a mais velha e que não se dava bem com a mãe, parece que por razões de egos.
Para fugir de tudo isso e enfrentar o vazio da solidão, Nora vai ter aulas de canto erudito com uma amiga. Todos ali são conhecidos, e isso pode gerar problemas para ela, que quer ser independente.
Nora tem um caráter forte. Indispõe-se no trabalho, associa-se a um sindicato contra seus próprios patrões. Luta com o padre, diretor do colégio onde seu filho estuda, por ele ter sido transferido sem motivo de uma classe para outra inferior. Mas uma coisa estranha, ou pelo menos um fato que intriga o leitor é que, na vida de uma viúva, ainda jovem, como ela, apenas com quarenta e cinco anos, ela não ter namorado. Ou melhor: ninguém na cidade ter procurado seduzi-la. O autor simplesmente ignora esse lance que talvez colocasse um pouco de sal nessa quase medíocre história de uma viúva que apenas quer viver tranquilamente.
Já quase no final do relato, o autor resolve dar uma de espertalhão e ousa atrair a atenção do leitor, algo enfarado com a enxurrada de diálogos e intimidades da virtuosa viúva: a aparição repentina do marido morto em seu quarto. Faz isso de maneira subliminar para parecer realidade ao leitor. Mas trata-se de um sonho. Acredito que o autor quer dar uma de espírita, incrustando na leitura um fato extraordinário.
O resto é “nada de novo no front” e a “bela” estória de Nora Webster, virtuosa viúva, que quer apenas viver, se esgota com essas palavras simples dentro de um cotidiano, quase a vulgaridade de um apagar de luzes:
“Nesse meio-tempo, a casa permaneceu em silêncio, um silêncio rompido apenas pelos barulhos suaves de Cornor no andar de cima e pelos estalos da lenha queimando lentamente na lareira.”
Como a dizer e nada mais tenho a falar sobre vida de Nora.
Nem o problema do conflito religioso na Irlanda serve de cenário mais entusiástico nesse simplório romance do Sr. Toíbín.
Bsb, 16.11.15

Próxima reunião do clube do livro será dia 03/12/2015.
O livro a ser discutido será "NORA WEBSTER".
Autor : Colm Tolbin
Editora : Companhia das Letras