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Topic-iconCLUBE DO LIVRO é "O FÍSICO", o autor Noah Gordon

8 anos 1 mês atrás#56por tereza

EPOPEIA DE UM MÉDICO MEDIEVAL

Murilo Moreira Veras

O livro em debate é “O Físico”, de Noah Gordon. Ex-repórter, técnico de medicina de emergência, é autor de best-sellers como The Rabbi, The Jerusalem Diamond e The Death Commitee.
Sem dúvida, é uma verdadeira epopéia da própria medicina na linha do tempo. Aliás, o autor parece que continua o tema com outro livro intitulado Xamã (The Rabbi), desta feita a história de um médico na idade moderna. Assim, o autor se propõe expor uma visão sistêmica da medicina.
Tentaremos, a seguir, sistematizar nossa crítica construtiva sobre o livro:
1. Do Enredo

Narra-se a história de vida de Robert J. Cole (Rob) desde infante. Seu pai era carpinteiro, depende do sindicato para sobreviver com a família de quatro filhos, um deles Rob. Pai e mãe acabam morrendo e os filhos, sem destinação familiar, são doados a pessoas e instituições de caridade. Os irmãos de Rob são separados, cada qual com uma família diferente. Rob vai para um seminário, mas, desgostoso com o tratamento, foge e passa a perambular pelas cidades como adolescente. Por sorte, Barber, uma mistura de curandeiro, paramédico e saltimbanco, contrata o rapazinho como aprendiz, a preço mais ou menos vil. A dupla percorre várias vilas e cidades da Inglaterra medieval (1025 a.D). Portanto, em plena Idade Média. Em cada estada, Barber no seu carro típico, marcado com signos estrambóticos (sol, lua, balança, cabra, etc) auxiliado pelo ajudante Rob, faz espetáculos mambembes, passes de mágica e, depois, atende pacientes, fazendo curativos, pequenas cirurgias e ainda vende uma beberragem chamada Medicamento Universal Especial ou Específico Universal, que serve para curar todas as doenças.
Depois de uma série de atropelos e até serem perseguidos, Barber acusado de curanderismo, o que era defeso à Igreja Católica, Rob acaba ser tornando substituto do mestre. E logo depois que Barber falece por causa de bebida, Rob herda tudo, porque o mestre não tinha família, inclusive a carroça com todos os pertences. Mesmo moço ainda, prossegue a mesma vida levada por Barber, fazendo tudo o que ele fazia, até mais, porque, desde a infância ele tinha o “dom de cura”. De fato, Rob é capaz de adivinhar se a pessoa vai morrer ou não, pelo simples aperto de mão da pessoa. Mas Rob acaba se apaixonando pelo que faz e decide aprender medicina, mas só no Oriente há escolas de mérito, os grandes médicos clinicam na Pérsia. Sozinho e solteiro, com sua carroça e um cavalo, ele decide partir para a Pérsia. A viagem é extremamente longa e perigosa, pois está repleta de assaltantes. Depois de muita dificuldade, problemas, porque ele tem de viajar em caravanas, inclusive se tornar judeu (apesar de ser cristão) com o nome fictício de Jesse ben Benjamin. Rob, ou Jesse ben Benjamin, consegue chegar à Ispahan na Pérsia. Depois de levar uma grande surra, ali ele consegue ingressar como estudante na escola de medicina dirigida por um dos maiores médicos do oriente: Ibn Sina. Mas logo ele se torna muito amigo do grande médico, inclusive seu ajudante. Os anos correm e Rob ou Jesse ben Benjamin se torna enfim um maristan – médico, depois de passar nos rigorosos exames. Nesse ínterim, ele reencontra Mary Cullen, cristã escocesa com quem viajara em caravanas antes, ela e o pai, e se envolveram emocionalmente. O pai dela falecera e ela estava sozinha. Resolvem se casar em juramento a dois. Mas ocorre que o poderoso Xá, Ala, seu nome, fica amigo de Rob e resolve beneficiá-lo por curas que praticou e pelos serviços reconhecidos inclusive pelo Ibn Sina. O Xá joga xadrez com Rob e se tornam amigos, fazendo passeios juntos. No íntimo, Rob sabe que esse Xá, na realidade, é um homem inconfiável e impiedoso, além de mal caráter. Rob se ajusta muito bem na cidade, é bem quisto e reconhecido, inclusive por ter conseguido, com colegas também médicos novatos, extinguir praga terrível que assolava vilarejo próximo.
Mas eis que dá-se um imbróglio. Ala, o Xa entra em luta fatal com outro Xá, por questões de território e posição. Ispahan é arrazada pelo inimigo e o pretencioso Ala é morto em combate. Por sorte, Rob consegue fugir com sua mulher e filhos. É então que faz o regresso à sua terra natal, Londres. Mas leva consigo um segredo familiar: o segundo filho tem a cara do Xá. É que Mary foi estruprada pelo audacioso Xá, em troca da vida de seu marido Rob.
Em Londres, Jesse ben Benjamin volta a ser Rob J. Cole, sua verdadeira identidade e estabelece-se como médico. Mas não é bem recebido por não pertencer ao círculo fechado de médicos londrinos, a maioria mercenários e com práticas inferiores às de Rob. Para não ser acusado de “bruxaria”, por descobrir a “doença do ventre” e depois de se encontrar com o irmão William, agora padre e responder processo inqusitorio, sem que do irmão receba nenhuma ajuda, Rob resolve enviar sua família para a Escócia, onde Mary tem seus parentes e propriedades, e foge de Londres, passando por agruras outra vez, inclusve ser contratado por pesqueiros.
O final da epopéia é mais ou menos holiwoodyano. Rob vai viver na propriedade de Mary, com quem consuma seu casamento em templo católico. Ali, naquela comunidde escocesa, ele vai finalmente exercer todas suas práticas médicas – e o mais importante, ser reconhecido por seus méritos extraordinários.

2. Nossa Crítica

O livro do sr. Noah Gordon é o resultado de uma grande pesquisa na área da medicina, como exercida no tempo medieval. A arte médica não nasceu de uma hora para outra. Resultou do trabalho contínuo de gerações até alcançar o grau de evolução da atualidade. É possível reconhecer, através da epopéia vivida pelo personagem – Rob J. Cole ou Jesse ben Benjamin – as diversas etapas por que passou a medicina, o exercício médico, no decorrer do tempo. Em Rob temos apenas um período da Idade Média, de 1020 a 1030 d.C, em que exerceu a medicina. Observe-se que a prática médica consistia numa mistura de curanderismo, benzeduras, encantamento e misticismo. À época só era consagrado o médico que tivesse recursos, muitos deles verdadeiros mercenários, como se vê na narrativa, quando em Londres, Rob tentou exercer a profissão e teve de fugir por suspeito de feitiçaria, pelo simples fato de haver desmentido os médicos londrinos, a respeito da temível “doença do ventre”. Rob sabia, por haver dissecado alguns cadáveres, que o interior do corpo humano era diferente do interior do porco, o animal objeto de estudo médico, já que “abrir o corpo humano” era vedado pela Igreja Católica, o ato incluso nas proibições da Inqusição.
Á época em que viveu o “físico” Rob –1030 – a prática médica sofria grande influência árabe, na Pérsia se encontravam grandes médicos como, por exemplo, Avicena (980-1037). Os médicos árabes ou judeus foram os precursores dos atuais médicos e instrutores dos chamados “barbeiros-cururgiões” (Barber, Rob e muitos outros). O próprio Avicena foi o autor de manual médico célebre “Cânone da Medicina”, no qual se baseavam esses protomédicos. Ora, sabemos que o pai da medicina foi Hipócretes (460 – 370 a.C). Outro notável foi Galeno (129-217 d.C) que estudou a anatomia humana tendo por modelo porcos, pois havia a ideia dominante de que o corpo humano era igual ao dos porcos, tendo escrito o livro “O Melhor Médico é também Filósofo”.
Vê-se que Rob ou ben Benjamin inteirou-se de certos conhecimentos filosóficos quando cursou a escola de medicina em Ispaham, conceitos e ideias que se misturavam com preceitos religiosos. É interessante notar que, à época, na Inglaterra e em outros países ocidentais, a medicina era exercida de forma muito precária, haja vista as práticas dos esforçados “barbeiros-cururgiões”.
À primeira vista o enredo e as peripécias vividas pelo personagem parecem não nos interessar. Mas, apuradas as circunstâncias e o fantasioso plot de que se vale o autor, concluimos que a epopéia de Rob Cole ou ben Benjamin nos afeta, no mínimo tomamos ciência de como a arte médica se desenvolveu, as dificuldades superadas à medida que evoluia a civilização. De uma coisa ficamos sabendo: a profissão de médico é muito mais significativa do que se ousa pensar. É isto que o autor quer insinuar ao construir um personagem como Rob que, desde a infância, é dotado do “dom de cura”. Será que isto não quer dizer que todo médico deve ser vocacionado e que seu grande objetivo, antes de qualquer outro mérito, é alcançar a cura do paciente? Aliás, constitui o cerne dos ensinamentos médicos de Hipócrates, o Pai da Medicina. E o que dizer dos médicos atuais? Será que são vocacionados para atender essa condição fundamental? Ou não passam de mercenários, que só visam a paga, quanto irão faturar com o tratamento?
Outro aspecto de certo modo admirável no livro é que o autor, jornalista e divulgador científico na área médica – portanto com todos os requisitos de ser ateu ou agnóstico – não faz do seu personagem um “ateu”, materialista, embora ele, explique-se, não seja propriamente um religioso. Também colabora o fato de ter convivido com grandes médicos árabes e judeus, todos pessoas muito religiosas. A própria esposa, Mary Cullen, escocesa de nascimento, é católica e sempre se refugiava em orações crísticas.
Observe-se como Rob, homem que teve uma infância sofrida, de família pobre e superado muitas dificuldades, violências que sofreu na pele, tendo com elas convivido ao longo da vida, ele não se vingou do Xá quando ele estuprou sua esposa. Ao contrário, agiu inclusive com misericordia para com seu filho, em quem via, a cada dia, surgirem os traços do ignominioso Xá.
De minha parte, colho desde logo uma observação. Apesar dos méritos, não necessarimente lterários, mas, sim, culturais de que se nutre o livro do sr. Noah Gordon, acredito que a história do “barbeiro-cirurgião”, que se tornou um maristan, não alcança aqueles obtidos pela narrativa de Taylor Caldwell, com sua fantástica e emocionante biografia de Lucas, em “Médico de Homens e de Almas”, que tivemos já o privilégio de ter discutido em nosso Clube do Livro.

Bsb, 8.03.16


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8 anos 1 mês atrás#55por tereza

O próximo livro em discussão no CLUBE DO LIVRO é "O FÍSICO", o autor Noah Gordon, ex-repórter de obras científicas. Resulta certamente de um grande trabalho de pesquisa sobre a Idade Média, no campo da medicina.

É uma ficção. O autor narra com minudências a carreira de um moço chamado Roy Cole, desde sua infância, seus problemas familiares, perda dos pais e separação dos irmãos, estes dispersados cada um sendo adotado por uma família. Mas ele, Roy, acaba fugindo do seminário para onde fora destinado e preferiu ganhar o mundo, sozinho. Acaba sendo ajudante, contratado a preço vil por um "barbeiro-cirurgião", Barber. Com ele, viaja pela Inglaterra, visitando pequenos povoados, vilas e cidades. É interessante como o livro faz um retrato da Inglaterra no ano 1021, quando se inicia a narrativa. Vilas em seu estado primitivo, inclusive a própria Londres, um aglomerado desordenado. O reino sob o jugo de um rei chamado Canuto, que não era inglês, sanguinário e que impõe altos impostos ao povo. Nosso personagem acompanha seu suposto benfeitor e tem de fazer praticamente tudo, limpar coisas, buscar alimentos, além de colaborar nas pantominas de máster Barber, que é, desde barbeiro, curandeiro e cirurgião. Aportam às vilas, com sua corropa típica, cheia de signos metafóricos, grita que tem espetáculo, faz mágica, depois atende os pacientes através de um biombo. Depois, vende sua beberragem que apelida de "Medicamento Especial Universal" , elixir específico, como dizia, capaz de curar de tudo.

Já estou na Quarta Parte do livro (pag.342). Roy já é um homenzarrão. Seu mestre Barber já faleceu e, como não tinha família, deixou tudo para ele, seu ajudante. O rapaz continua a mesma função, inclusive porque, desde a infância, possui o "dom de cura", quando pega na mão das pessoas que atende. Mas tem um único objetivo: ser realmente um MÉDICO. Com esse intuito ele atravessa toda a Inglaterra, França e vai acabar na Pérsia, onde se encontram, à época, as melhores escolas de medicina. Passa, inclusive, a ser como se fosse "judeu". Nessas suas andanças, acontece de tudo, até uma briga com uma "pantera"!

É evidente que "O Físico" não chega os pés da obra-prima de Taylor Caldwell, já discutido em nosso Clube, mas é mais ou menos seu contraponto. Essa discussão ficará para depois.

Murilo Moreira Veras


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8 anos 1 mês atrás#54por tereza

CLUBE DO LIVRO

A próxima reunião será no dia 23.03.16 e o livro a ser discutido é que se segue:

Título : O FÍSICO
Autor : Noah Gordon


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