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Topic-iconMATURIDADE — UMA EXPERIÊNCIA INTERIOR

3 anos 7 meses atrás#98por bruno

Murilo Moreira Veras

O livro em pauta é Com a Maturidade Fica-se mais Jovem, o autor o escritor laureado com o Nobel de 1946 – Hermann Hesse. Alemão nacionalizado suiço, prolífico inundou o mundo com romances, como Peter Camenzind (1904), Gertrud (1910), mas ficou mais conhecido pelos livros Sidarta (1922), Lobo da Estepe (1930) e Damian. Foi leitura como que obrigatória dos iniciantes na contracultura, depois por suas obras de cunho budista.
Comentarei o livro algo diferente, seguindo a leitura que fiz com algumas observações, às vezes aleatórias, mas pertinentes ao espírito do livro do sr. Hesse.

Pag. 41 – Sobre o tema Velhice:
...Superar o sofrimento e a morte é tarefa da velhice, enquanto o entusiasmo, o arrojo e a agitação constituem partes do temperamento da juventude. Ambas podem ser amigas, mas falam idiomas diferentes.
Comento: Nem sempre temos condições de superar o sofrimento. É uma arte o fazê-lo. Idiomas diferentes? O sofrimento se apresenta no mesmo idioma, o idioma da dor, compreendê-lo e superá-lo, depende do estado espiritual do suposto sofredor.

Pag. 45 – Esboço (poema):
...Com a maturidade, nos tornamos cada m ais jovens. Isso também acontece comigo, embora não queira dizer muito, uma vez que no fundo, sempre tive a mesma disposição da mocidade, encarando a idade adulta e a velhice como uma espécie de comédia.
Comento: Não há negar — envelhecer é uma arte. Penso que hoje, no meu caso, tenho mais vigor intelectual e até artístico do que quando fui mais jovem. O jovem é sempre afoito, às vezes não entende muito o que seja o sentido da vida. Já os supostos velhos, encanecidos pela idade e os cabelos brancos — adquiriram mais maturidade intelectual, veem as coisas depuradas, filtradas pela razão.

Pag. 49 — Harmonia entre movimento e repouso:
...A interminável e pantomímica dança da copa na tempestade foi apenas uma imagem, uma revelação dos mistérios do mundo além da força e da fraqueza, do bem e do mal, dos atos e dos sofrimentos.
Comento: Neste capítulo Hesse se refere aos mistérios naturais e espirituais que envolvem a vida e o mundo. Compara-os a uma árvore açoitada pela fúria dos ventos. Nós, humanos, às vezes somos açoitados pelas desventuras, os sofrimentos imprevistos e sofremos sem termos adquirido a sabedoria necessária para compreender tais mistérios.

Pag. 57 — Sobre a velhice:
... Ser velho é uma tarefa tão bela e sagrada quanto ser jovem, da mesma forma que aprender a morrer e saber morrer são atributos tão valiosos quanto quaisquer outros, desde que o encaremos com o devido respeito pelo significado e pela santidade da vida. O velho que odeia e teme a velhice, os cabelos e a proximidade da morte é tão indigno de representar sua categoria quanto o ser jovem e vigoroso que a própria profissão e sua atividade diária, delas tentando esquivar-se.
Comento: Hesse nos faz um relato do que acha que seja a vida dos anciãos. Assegura-nos a experiência que os protótipos dos jovens e dos velhos, às vezes, têm conceitos diferentes. Há jovens que se acham velhos porque desfiguraram sua juventude. A recíproca também é verdadeira: há anciãos que não reconhecem sua própria condição e se passam por novos, ou querem fazê-lo, o que os tornam ridículos no convívio societário.

Pag.65 — Dia Cinzento de Inverno (poema):
... À entrada de um novo espaço vital, o átrio da velhice, um velho vos deseja os dons que a vida tem a nos oferece nessa etapa: maior independência da opinião alheira, maior tranquilidade, insensibilidade às paixões e imortal devoção ao eterno.
Comento: O átrio da velhice, às vezes, é dispare, ao qualificar os avançados na idade. Uns se deixam enrodilhar em paixões, o que os tornam ridículos. O famoso caso do Crime da Mala, ocorrido no século passado em São Luís, Ma, é típico. O vetusto Desembargador Vergueiro cai de paixão por uma “rapariga”, com ela se relaciona, mas é por ela atraiçoado. Louco de ciúme, maquina o crime: tira-lhe a vida e em pedaços, coloca-a numa mala previamente preparada. O crime abalou a cidade e integra a lista de assassinatos mais sinistros ocorridos nos arquivos criminais.

Pag. 103 — Um chamado do Outro Lado das Convenções:
... É inegável que meus textos contêm, aqui e ali, uma fagulha, um esboço das nuvens e filigranas de um tradicional retábulo, detrás do qual se imagina uma ameaça apocalíptica; (Pag.105). ... A vida tem um sentido? Não seria melhor dar um tiro na cabeça?

Comento: Parece ser este um dos principais motivos que levam as pessoas ao suicídio — a falta de um sentido da vida. Nosso Hesse parece-me algo tergiversativo quando lhe cai no colo essa indagação do “rapaz desconhecido”. Suas elucubrações são ambíguas, fogem do sentido, até nos embaralham a mente. Ora, o sentido da vida é a vida ter sentido, é a pessoa crer na existência e fazer dela uma direção. O ateu ou o agnóstico certamente não tem sentido da vida. Ele vive simplesmente por viver — é a sartriana filosofia de vida de o autor de “O inferno são os Outros.”
Pag. 113 — Experiências Outonais:
Comento: As ditas experiências outonais do autor estão eivadas de tristeza, espécie de consolo e exemplo, como ele refere. Não afinam com meu gosto.
Pag. 149 — Epílogo (comentário final de Volker Michels sobre o autor e seu livro):
... “O objetivo de todo esforço poético seria a semelhança, no ocaso da vida, com Hermann Hesse. Sem embargo, a intimidade com a sua vida e as suas realizações nos dispensa da leitura de sua obra, bastando apenas um olhar, pois a identidade da pessoa escrita se confunde com seu próprio semblante. Se não o lêssemos, no entanto, na realidade não o veríamos.”

NOSSO COMENTÁRIO FINAL

O livro do sr. Hermann Hesse serve-nos como espécie de laudatório epifânico da velhice, enquanto desfia, também, as mazelas da decadência física do ser humano. Como não bastasse, em estilo edênico, o Nobel alemão naturalizado suíço compara a decadência física do homo sapiens, sapiens ao desfibramento outonal da natureza.

Ora, essa espécie de cogitur ergo sum descartiano do envelhecer humano, a despeito do agir perfunctório da existência, não nos reacende a sede de viver, ao contrário, nos abate devido a transmissão linear de todos os nossos achaque. Na realidade, não somos musgo, arbusto, árvore ou instrumento da natureza que se abate no seu definhamento. A comparação pode configurar certa estilística primorosa do autor — mas dela pensamos que só nos destila nostalgia à vida, todo o vezo negativo da velhice. Ou seja: nos oprime.
A essa altura dos eventos, o de que precisamos é de ânimo, solfejos de esperança, ânsias de criatividade e imaginação sobre a vida e o amor — não de lamúrias existenciais, louvação ao passadismo do qual somos, agora, meros peregrinos.
Bsb, 18.09.20

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