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Topic-iconLYGIA : A DISCIPLINA DO AMOR

1 ano 11 meses atrás#123por bruno

LYGIA : A DISCIPLINA DO AMOR

Murilo Moreira Veras

O livro hoje — 26.04.22 — a ser discutido é A Disciplina do Amor, a autora Lygia Fagundes Telles, selo da Companhia das Letras. É mais um livro da autora que lemos no Clube do Livro.
1. Preâmbulo

A autora, Lygia Fagundes Telles, faleceu no início do mês, sabe-se de falência dos órgãos. A mídia informa que ela tinha 98 anos, faltando poucos dias para completar 99. Pesquisamos e logo verificamos que, na realidade, ela faleceu com 103, quase 104 anos. É só consultar a Wikipédia. Acontece que Lygia, misteriosa como sempre, escondeu 5 anos de sua vida. Observe-se que ela era procuradora do Instituto de Previdência do estado de S. Paulo. Por mérito literário, pertencia a Academia de Letras de São Paulo e Academia Brasileira de Letras. Também pelo mesmo mérito, obteve quase todos os prêmios possíveis, Jabuti, até o maior galardão em língua lusófona, o Camões em 2005, pelo conjunto de sua obra. Foi ovacionada pela crítica, quase todos os seus livros premiados, sem falar que foi o quindim de ioiô dos luminares literários, Érico Veríssimo, Paulo Ronái, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector e Hilda Hilst, as duas últimas suas grandes amigas, segundo afirmou. Crítica escrita e falada, ela foi entrevistada, suas obras decantadas a quatro ventos. No entanto, declara que não vivia de livros, ela uma simples autora do terceiro mundo. Este livro inclusive recebeu o prêmio Jabuti e do IPCA. E mais: ela própria declara que é sua melhor obra. Afirma ser uma escritora engajada, certamente também com a realidade brasileira e mundial, embora, não seja política.

2. Do Conteúdo e Filigranas

Os críticos quase todos concordam com o mérito deste livro escrito em 1980, acompanhando a aferição da própria autora. Vou discordar, não como crítico de carteirinha, que não o sou e se alguma observação qualitativa faço, apego-me sempre à discrição normativa de Machado de Assis, isto é, não demolir o autor, espelhar alguns aspectos de sua obra, sob a égide da ética e estética literária. Considero-me apenas um leitor atento.

Logo de início, o livro não me parece de contos, mas, sim, resultado de fragmentos de sonhos, impressões, convicções pessoais, observações e lembranças de viagens — quem sabe crônicas ou simples anotações de leituras. Não propriamente contos, embora Mário de Andrade tenha dito que se um escrito o autor disser que é conto, que seja conto. Tecnicamente a matéria literária, como a da autora, não tem o caráter do conto — uma estória curta, com começo, meio e fim. Não me convenço, como leitor de quase todos os livros da autora, que este A Disciplina do Amor seja seu melhor trabalho. É interessante, admira-se sua maneira de escrever, fazendo certas alusões simbólicas, crítica velada, o mistério escondido em certos momentos, cuidado e acuidade quanto à recepção do leitor — minudências em que ela, Lygia, é mestra, sobretudo em seus contos. Entretanto, faço algumas leves observações sobre o valor de seu pensamento e suas convicções expostas neste livro específico.

3. Impressões Pessoais

Vou expor apenas algumas digressões sobre o livro, reproduzindo o que escrevi em certas páginas:
Pag. 140 – Frases Fatais : Nesta pequena crônica, evidencio a contradição da autora, que esquece fundamentar seu juízo. As feministas são por demais extremadas, exorbitam da verdadeira razão de serem acima dos homens — esquecem que são a contraparte do homem. Recorrer a Che Guevara não é bom argumento: ele na verdade foi um monstro transviado de libertador, sabe-se que chegou a matar seus próprios companheiros desafetos, cinicamente sorrindo.

Pag. 143 – Revolução na Igreja: Vê-se, nas entrelinhas, que a autora se contagiou dessa virulenta interpretação à teologia católica, que é a ideologia marxista, a chamada esquerda católica. Se alguns padres empederniram a Igreja com regras medievais, esse desvio não deve macular os ensinamentos preconizados pela fé católica, uma parte podre não deve contaminar o todo. Essa doutrina desvirtuada pelo Vaticano II talvez tenha contribuído para essa invasão espúrias às hostes católica, contrária aos ensinamentos crísticos, que foi e continua sendo a Teoria da Libertação. A autora se apoia em Tristão de Athayde, o venerável escritor católico que defendeu a politização do País através do esquerdismo. Alceu de Amoroso Lima, seu verdadeiro nome, deixou-se enganar, entrando na onda da maioria dos escritores, artistas e aproveitadores sociais. A autora esquece que a Igreja é representada pela ortodoxia verdadeira, vultos de pessoas sábias, do passado e do presente, como, por exemplo, G.K. Chesterton. Sem falar nos seus construtores: Sto.Agostinho, Sto.Tomás de Aquino, Santa Tereza d’Ávila. Sem desmerecer os méritos literários da autora, é de se esperar que ela recorresse à leitura da história da Igreja e não fizesse julgamento prévio à esquerdista, na pressuposição de salvar o Brasil e o cristianismo da direita fascista.


Pag. 150 — O Escritor e o Leitor: Nesse breve anúncio Lygia assegura que ...”O escritor pode ser corrompido mas não corrompe. Pode ser louco, mas não vai enlouquecer o leitor, ao contrário, poderá até desviá-lo da loucura.” Em entrevistas ela confirma essa sua convicção. Discordo. O escritor não está imune de, através de seus escritos, se tornar perigoso. O ofício de escrever deve se manter ao nível da ética e da moral. Não se trata de censura que o obrigaria a deixar de escrever, mas de uma obrigação moral.

Escritores há e houve que fizeram grande mal à humanidade, embora tenham sido grandes e apreciados autores. À guisa de exemplário, eis alguns:

- Marquês de Sade e Emil Cioran, ambos de escrita execrável.
- Goethe, com seu livro Werther cuja leitura acarretou muitos suicídios no mundo inteiro.
- Shopenhauer, com seu desastroso pessimismo.
- Nietzsche, pelo seu nihilismo, desnorteando as pessoas.
- Baudelaire, com suas poesias negativas, as Flores do Mal.
- Montaigne, devido seu exagerado ceticismo.
- Diógenes, filósofo grego que inundou o mundo com seu cinismo filosófico. E tutti quanti mais.

4.À Guisa de Conclusão
Essas nossas ressalvas, tanto ou quanto pessoais, não denigre de maneira alguma a obra de Lygia Fagundes Telles, escritora de tantos dotes literários, já traduzida para meio mundo (Paulo Coelho também o foi, mas descabe qualquer comparação). Reconheço-a como a grande dama da literatura brasileira atual. Seu passamento deixa um vazio nas letras, além de ter sido pessoa admirável e admirada, inclusive por este que subscreve essas sinuosas, mas sinceras linhas.

Bsb. 14.04.22

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